A “esposa do arqueólogo” que foi pioneira por próprio direito
Apesar do seu trabalho ter sido negligenciado em vida, Ann Axtell Morris contribuiu para uma compreensão mais aprofundada sobre a vida e cultura dos antigos nativos americanos e indígenas mexicanos.

Ann Axtell Morris fotografada com o marido, Earl Halstead Morris, em Chichen Itza, no México, em 1924.
Ann Axtell Morris ficou imóvel, ciente de que qualquer movimento a poderia fazer mergulhar para uma queda de 30 metros até ao solo do deserto mais abaixo. A escalada desta jovem arqueóloga até um antigo retiro num penhasco resultou na descoberta de objetos Navajo. Contudo, Ann Morris subestimou o quão difícil seria voltar a descer.
“Eu sabia que ninguém no acampamento fazia ideia de onde é que eu estava”, escreveu Ann Morris em 1933. “O que quer que fosse preciso fazer, tinha de ser eu a fazer.” Lentamente, Ann desceu a parede do penhasco, perdendo os sapatos ao longo do caminho e tomando a decisão de desistir da sua ousadia assim que descesse em segurança.
Mas essa resolução não durou muito: “Acho que mantive a [promessa] nesses três dias.”
O fascínio implacável de Ann Morris por relíquias da vida antiga catapultou-a para uma carreira célebre na arqueologia. Porém, durante o seu tempo de vida, as suas contribuições para a arqueologia no sudoeste americano e no México foram amplamente ignoradas devido ao facto de ser mulher.
A “caçadora de tesouros”
Ann Axtell Morris (esquerda) na Caverna de Carlsbad na década de 1920.
Nascida em 1900, Ann Morris começou a ficar fascinada com o passado desde tenra idade. Ann entrou em contacto com a arqueologia na década de 1920. Foi uma época de ouro para este campo, que se tornou mais científico e profissionalizado no final do século XIX. No entanto, esta disciplina não acolhia bem as mulheres – apesar dos avanços feitos na educação das mulheres, esta profissão era maioritariamente exercida pelos homens e as mulheres enfrentavam vários tipos de discriminação, tanto no emprego, para publicar as suas investigações ou simplesmente para trabalhar no terreno.
Mas isso não a dissuadiu. Depois de concluir os estudos na Faculdade Smith, Ann Morris teve formação profissional em França, fazendo trabalho de campo em arqueologia pré-histórica. Em 1923, Ann casou-se com Earl Halstead Morris, um arqueólogo proeminente conhecido pelo seu trabalho no sudoeste americano e no México, e que supostamente serviu de inspiração para o personagem de Indiana Jones.
Apesar de minimizar muitas vezes a sua própria experiência e apresentar-se como a esposa de um arqueólogo, Ann Morris era uma arqueóloga talentosa por direito próprio. Nas escavações feitas em Canyon de Chelly no Arizona, nas Ruínas Astecas no Novo México e em Mesa Verde no Colorado, Ann Morris documentou petróglifos antigos e pinturas rupestres em aquarela.
Nas ruínas Maia em Chichen Itza, no México, Ann Morris escavou ao lado dos homens, apesar de ter sido contratada para cuidar das crianças no local. E Ann também contribuiu para uma compreensão mais aprofundada sobre a vida e cultura dos antigos nativos americanos e indígenas mexicanos cujas sociedades complexas têm sido negligenciadas.
Escondido entre detalhes
Contudo, apesar de todos os seus feitos, o trabalho de Ann Morris foi frequentemente esquecido em artigos que tinham o nome do marido ou nem sequer foi creditado. Ann Morris foi autora de dois livros muito conhecidos sobre o trabalho de campo arqueológico para o público em geral, mas muitas vezes Ann trabalhou sem remuneração e foi preterida em favor do marido. Ann Morris enfrentou problemas de saúde e alcoolismo, morrendo aos 45 anos de idade em 1945.
O legado de Ann Morris tem vindo a crescer nos últimos anos, à medida que os estudiosos revisitam as histórias das mulheres pioneiras no campo da arqueologia. Ann Morris é agora amplamente creditada por ajudar a abrir este campo para as mulheres e por inspirar gerações de leitores com paixão pela arqueologia. O filme biográfico Canyon Del Muerto recorda a vida pioneira de Ann Morris.
Apesar de todos os contratempos da sua vida recheada de aventuras, Ann Morris é agora lembrada como uma pioneira. “Na minha opinião”, escreveu Ann em 1934, “a arqueologia é a carreira mais interessante e estimulante do mundo”.
Este artigo foi publicado originalmente em inglês no site nationalgeographic.com