Porque é que o galego e o português são tão semelhantes?
Há muito mais a unir o galego do português do que aquilo que os separa. Conheça a história que está na origem da língua portuguesa.

Neste mapa da Galiza, dois dos edifícios mais significativos são a Catedral de Santiago de Compostela e a Torre de Hércules na Corunha - o único farol romano totalmente preservado que ainda é usado para sinalização marítima e que é considerado Património Mundial da UNESCO.
A diversidade de povos que ocupou a Península Ibérica moldou ao longo dos séculos tudo aquilo que portugueses e espanhóis são hoje. E a língua é uma das provas mais evidentes dessa herança histórica e cultural.
Um dos casos que mais nos aproxima dessa herança histórica, é a relação entre o galego e o português, que partilham origens, palavras e fonemas muito semelhantes.
Na realidade, olhando para a história da língua portuguesa, podemos afirmar que esta não surgiu em 1143 quando D. Afonso Henriques proclamou a independência de “Portucale”. A língua portuguesa, ou melhor, os dialetos que estão na sua origem, já existiam antes de Portugal. E é muito daí que vem a semelhança que existe entre o galego e o português. Para entendermos estas semelhanças, comecemos então por olhar para os fatores históricos.
Quais são as origens do galego e do português?
Existem duas escolas que advogam origens diferentes do português e do galego. A mais comum afirma que ambas derivam do latim vulgar. Este latim vulgar dera origem ao galaico-português (também designado como galego-português), que ao longo do tempo, se dividiu em duas línguas, o galego e o português.
A outra escola, defendida pelo linguista Fernando Venâncio, diz mesmo que o português vem diretamente do galego e o galego é que tem origem no latim vulgar.
Apesar de indicarem origens diferentes, estas duas escolas acabam por partilhar muitos argumentos e factos em comum que explicam a origem do galego e do português. São esses factos que passaremos a descrever abaixo para explicar a origem destas duas línguas.
Ainda antes de Portugal existir, já se falava galego ou galaico-português na região do Minho e na Galiza. Esta língua derivou diretamente do latim vulgar, o latim falado pelo povo e que divergia do latim clássico, falado pela elite do Império Romano. Este latim vulgar fora também influenciado pela herança de outros povos que ocuparam a Península Ibérica, como é o caso dos povos Celtas que aí viveram antes dos Romanos ou até dos Iberos, o povo autóctone da Península Ibérica. Da herança céltica, podemos destacar, por exemplo, o nome do Rio Douro, que deriva do Celta “Dur”, que significa água.
Com a formação de Portugal em 1143 começaram a ser delineadas as fronteiras a Norte que separam hoje Espanha (região da Galiza) e o país de Camões. Mas apesar dessa delineação, o galego ou o galaico-português foi a língua falada em Portugal ainda por muitos anos, até meados dos séculos XIV e XV, quando o galego e o português começaram a divergir, principalmente com a definição de um novo idioma - o português.
Mas esta divisão não aconteceu apenas pela evolução e crescimento de Portugal como país. O domínio de Castela sobre a região da Galiza levou a que esta utilizasse cada vez mais o castelhano, em detrimento do galego. A conjugação destes fatores levou a que o galego ou galaico-português se dividisse para sempre em duas línguas.
Qual o impacto da semelhança entre o galego e o português?
À primeira vista, salta a facilidade de entendimento entre o galego e o português, tanto na linguagem escrita como na linguagem falada. Isto abre a porta a que as trocas comerciais e culturais se desenvolvam facilmente entre o povo da Galiza e o povo português.
Esta semelhança entre as duas línguas é tão grande, que muitas vezes o galego aproxima-se mais do português do que do próprio espanhol. Por exemplo, “cão” em galego é “can”, enquanto em espanhol diz-se “perro”. “Carro” em português e galego são iguais, enquanto em espanhol diz-se “coche”.
Outro aspeto importante na relação entre o galego e o português é o papel importante que o português pode ter na preservação do galego. Segundo Eduardo Maragoto, presidente da Associaçom Galega da Língua, atualmente, apenas 50% dos habitantes da Galiza falam galego. Olhando somente para a faixa etária mais jovem, esse valor desce para os 20%. Isto acontece devido ao maior poderio económico e social da língua espanhola. É aqui que a semelhança entre o galego e o português e todo o histórico que partilham se tornam em argumentos a favor da preservação do galego, dando lugar a várias iniciativas que valorizam a relação entre estas duas línguas. Um exemplo disso é o Prémio Literário Nortear que permite candidaturas quer em galego, quer em português.
Acerca da semelhança entre o galego e o português e da importância da preservação do primeiro idioma, aconselhamos a leitura desta entrevista feita a Eduardo Maragoto. Uma entrevista escrita em galego mas que qualquer Português entenderá facilmente.
O que é que nos ensina?
A semelhança entre estas duas línguas leva-nos numa viagem histórica pelos povos que ocuparam a Península Ibérica. Uma viagem que nos relembra a influência que as interações entre estes povos têm sobre aquilo que somos hoje.
Mas quais são as conclusões mais importantes sobre as semelhanças entre o galego e o português?
A primeira leva-nos a afirmar que é impossível compreender a história da língua portuguesa sem a história do galego. E vice-versa.
A segunda é que a língua não é estática. Está sempre em evolução e é definida pela interação dos seus falantes com falantes de outras línguas. No passado, essa interação marcou-se sobretudo a norte de Portugal, onde o português surgiu do galego ou do galaico-português.
Mesmo hoje, o nosso idioma continua a ser influenciado por outras línguas, sobretudo pelo inglês, onde vemos os estrangeirismos a tomar um lugar no nosso dia a dia. E isso é só um resultado natural da interação entre povos diferentes.