Dominique Gonçalves: “Tudo o que fazemos na natureza tem consequências para o bem-estar humano.”
Dominique Gonçalves trabalha no Parque Nacional da Gorongosa, onde lidera o Elephant Ecology Project.
Nasceu e foi criada na Beira, uma cidade moçambicana próxima do Parque Nacional da Gorongosa. Em 2015, integrou a equipa do parque como bolseira de investigação, onde lidera agora o Elephant Ecology Project, que investiga o movimento dos elefantes e a expansão do seu raio de ação em relação ao uso do habitat e ao conflito homem-elefante. Dedica-se tanto à conservação das espécies quanto ao desenvolvimento das comunidades nos arredores do parque.
Defensora fervorosa da educação das raparigas, apoia o projeto Clube das Raparigas do Parque, em que usa elefantes como uma espécie emblemática para ajudar a inspirar e melhorar a experiência escolar de raparigas vulneráveis, para evitar o casamento precoce e ajudá-las a ter melhores oportunidades. Ambiciona construir a coexistência entre as comunidades e a vida selvagem em toda a zona tampão do parque.
Atualmente é exploradora da National Geographic Society, e em 2020 foi uma das nomeadas para o Prémio Pritzker Emerging Environmental Genius. Em 2021, foi reconhecida pelo Explorer's Club como uma das 50 People Changing the World e também recebeu a Bolsa Wild Elements Innovator. Em 2022, tornou-se uma das conservacionistas apoiadas pelo Programa Career do WCN.
Como é um típico dia de trabalho para a Dominique?
Em geral é uma mistura de pesquisa, apoio aos Clubes das Raparigas e à equipa de coexistência do Parque Nacional da Gorongosa.
Quando no Parque: visita ao campo, monitorização de elefantes no campo e no escritório através de sistemas de monitorização, apoio e visitas aos clubes das raparigas e a equipa de coexistência do Parque.
Quando no escritório e na Universidade: escrita de relatórios, propostas de fundos e a minha pesquisa de doutoramento.
Dominique Gonçalves vai estar no palco do Summit Junior, da parta da manhã, e no palco da tarde com Dwayne Fields, Bertie Gregory, Céline Cousteau, David Doubilet e Jennifer Hayes.
Qual é o laço que a une aos elefantes? Porque decidiu trabalhar com esta espécie?
Decidi trabalhar com esta espécie porque tive oportunidade para tal. Nunca sonhei ou tive preferência por elefantes, mas quando apareceu a oportunidade não pensei duas vezes. Quem não gostaria de trabalhar com elefantes? É simplesmente fascinante e não me arrependo.
Quais são os maiores desafios que teve no seu trabalho?
As mulheres que trabalham na Ciência, são frequentemente questionadas e precisam de fazer um esforço duplicado para que o seu valor e o seu trabalho seja levado a sério. Isso acontece em todo lado e a todos os níveis: academia, no trabalho, nas comunidades locais e no campo. Eu abordo esse desafio falando abertamente sobre preconceitos inconscientes baseados em género no trabalho, com colaboradores da comunidade e com estudantes (nacional e internacionalmente).
Como podem as comunidades locais coexistir melhor com as espécies animais?
Essa é a resposta que todos procuramos e precisamos. A coexistência entre pessoas e fauna não tem de ser alcançada de uma única maneira, depende de contexto, cultura entre outras coisas. Uma das primeiras coisas que aprendi como conservacionista é que o pragmatismo funciona, a ideologia nem sempre. Precisamos de ouvir e tomar decisões práticas para cada área, decisões baseadas na realidade do lugar. As visões, ideias e desejos das comunidades devem ser respeitados e as suas vozes amplificadas para que a convivência continue a ser possível.
Coexistência é um termo bonito, não é fácil, mas vale a pena. As pessoas precisam da natureza, para serem saudáveis, para prosperar. No entanto, temos que navegar com cuidado onde as pessoas vivem e onde há natureza. O mais importante é que tenhamos consciência que a natureza também precisa de espaço e recursos assim como nós precisamos e temos que aceitar isso.
“Diversidade étnica e racial na ciência representa plenitude, verdade e riqueza de conhecimento.”
Como é que a diversidade étnica e racial se reflete na ciência?
Se a ciência tem como base a diversidade de pensamentos e elementos então porque não está a ser feita por diversas raças e etnias? Pense num puzzle, cada peça tem diferentes formas e cores, mas no final quando postas todas juntas mostram a grandeza e beleza detalhada. Assim é a ciência, identificando peças e pondo-as juntas na tentativa de entender melhor e prever como o universo biológico, físico, social, etc. funciona. Caso faltem algumas peças o puzzle fica incompleto - o conhecimento não é completo nem reflete a verdade e pior, se todas as peças forem iguais em forma e cor, não há desafio em pôr as peças juntas e é difícil ver a imagem completa então nem conhecimento pode ser alcançado ou ser verdadeiro.
Diversidade étnica e racial na ciência representa plenitude, verdade e riqueza de conhecimento.
Que expectativas tem para a conservação dos elefantes?
Embora a tendência geral seja de declínio populacional, o que até deu às espécies de elefantes diferentes status de conservação, em certos lugares a população de elefantes está a aumentar. No entanto, tudo parece frágil e continuará sendo até que ameaças sejam eliminadas: da demanda do marfim, fragmentação de habitats e interação negativa entre pessoas e elefantes.
Para proteger a biodiversidade e os ecossistemas, precisamos mais do que apenas garantir a integridade dos limites da paisagem. Precisamos de saber o que temos, precisamos de ver o valor do conhecimento abrangente da biodiversidade e a criação de uma imagem detalhada da vida para a gestão e proteção da biodiversidade. Espero que tenhamos mais defensores e vozes locais para os elefantes. Campeões, líderes e locais que olhem para tudo e em todas as áreas: pesquisa, conservação, política, tomada de decisões, etc. A criação e o apoio de uma nova geração de especialistas em biodiversidade, investigadores e conservacionistas locais é de extrema importância porque são eles que garantirão a sobrevivência da biodiversidade, especialmente dos elefantes.
Se pudesse pedir um desejo em prol do Planeta, qual seria?
Que as pessoas comecem a pensar e a ver a natureza e as pessoas juntas, não apenas como forma de ganhar dinheiro, mas como forma de vida, de convivência. Para isso, precisamos de perceber que as pessoas e a vida selvagem fazem parte do mesmo sistema e ambas precisam de aprender a viver juntas. Precisamos de reconectar-nos com a natureza, connosco como parte dela e ela como parte de nós. Tudo o que fazemos na natureza tem consequências para o bem-estar humano.